Quando fecho os olhos 🙈

     

Foto: Telma de Oliveira

     Procuro por ti numa busca infindável... Procuro por ti na esperança que voltes como eras... Procuro por ti como quem procura o seu porto de abrigo!
     Tenho de aceitar, jamais irás voltar como um dia eu te conheci! Nunca mais será igual!
Olho para ti e pergunto me "O que te fizeram?".
     Nasci em São Vicente e aí fui criada nas portas de Alfama, que também tão bem me acolheu, e já havia acolhido meu pai e meu avô, dois filhos puros de Alfama. Hoje vivo de memórias de tempos que já não voltam!
     O meu porto de abrigo foi levado e deu lugar ao Alojamento Local! Os meus amigos, vizinhos, conhecidos foram embora quando a sustentabilidade da situação se tornou caótica!      Dizem agora que é um luxo morar aqui. Mas eu sempre morei aqui, mesmo quando o mundo não sabia de todo esse luxo. Sim eras um luxo! Aquelas ruas eram o meu chão, nas mais variadas formas! Eram o meu mundo encantado e onde eu realmente me sentia em casa.
     Passaram mais de vinte anos e o meu mundo desapareceu! As minhas pessoas tiveram de ir para virem outras que não sei quem são, e mudam á velocidade da luz. Perdem-se os laços, perdem-se famílias, amigos, vidas!
     As manobras que utilizam para nos levar, aos poucos que restam, ao limite do estado de nervos, são inúmeras! Muitas vezes desumanas!
     Tentam matar a nossa história para  fazer render os seus próprios bolsos em prol de um turismo (in)sustentável!
     Nem com as suas pessoas são sinceros. Prometem o típico de uma zona história, com tudo o que isso engloba. Típico que já não existe! Paredes caem e levantam se de novo, agora pessoas são insubstituíveis! O típico do bairro não eram só as paredes das casas velhas que o envolviam. O típico do bairro eram também as pessoas! As gentes!
     A vizinha a vir gritar á janela para as outras apanharem a roupa. O vizinho, que até era habilidoso, e arranjava o necessário em casa de quem precisasse em troca de uma boa bifana no pão e de um copo de vinho. Pessoas sentadas na entrada de sua casa a conversar, discutir, a viver.
     Éramos uma família enorme, ficámos reduzidos a memórias. Sim essas não conseguem matar! Essas Não!
Quando fecho os olhos o meu porto de abrigo continua lá!
     A dona Nazaré continua sentada á sua porta (que já não existe) a fazer as rendas de bilros. O Zé Papa continua sempre que me vê, a cumprimentar me como um avô a uma neta, um amor puro e sem exigências. A dona Lucinda continua a andar com mais de vinte gatos atrás dela, e a ser a Deusa deles com um cheiro característico e indescritível.
     A Cátia continua á minha espera para montar-mos arraial no passeio e brincarmos com tudo aquilo que conseguirmos desarrumar até nos obrigarem a ir jantar! A Ruanna continua a ir comigo todos os dias para a piscina, e passamos tardes a imaginar o nosso mundo de sonho. A minha mãe continua a vir gritar do quarto andar o meu nome para saber em que parte do bairro estou, e a sua projeção de voz é fenomenal!
     Quando fecho os olhos tudo está igual, nas minhas memórias onde ninguém pode arrendar ou vender! Onde o meu mundo continua intacto e feliz!
     Onde só eu entro tenho toda essa gente! Toda essa vida! Todo o típico que é realmente típico!
     Sou grata pelas experiências que tenho, pela infância que vivi e por todas as memórias que posso levar para a vida na minha mala da mente!

Telma de Oliveira 

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